Universidades apresentam relatório sobre impactos do mercúrio na Amazônia durante evento no TRT-8

A Justiça do Trabalho tem se mostrado um ator essencial no combate à contaminação por mercúrio no Brasil. É por meio dela que muitos trabalhadores expostos a esse metal pesado conseguem ser ouvidos. Essa constatação foi revelada pela pesquisa sobre os impactos do mercúrio na saúde humana e nas decisões judiciais brasileiras, conduzida pela Rede Amazônica de Clínicas de Direitos Humanos — iniciativa que reúne instituições como a Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), Universidade Estadual do Amazonas (UEAM) e Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). Os resultados foram apresentados nesta quinta-feira, 21, no Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT-8), em Belém.
O estudo, que resultou em um relatório técnico entregue ao tribunal, analisou decisões judiciais relacionadas à exposição ao mercúrio, com foco especial na Justiça do Trabalho. Segundo a professora da UFPA, Cristina Terezo, “esse ramo do Judiciário tem sido a principal porta de entrada para trabalhadores que alegam problemas de saúde decorrentes do contato com o metal tóxico e não o Ministério da Saúde, como se poderia imaginar”.
A coordenadora da Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal do Amapá, Elinara Oeiras Assunção, explicou que a pesquisa teve como objetivo observar como os tribunais do trabalho têm julgado casos envolvendo trabalhadores contaminados por mercúrio, especialmente em atividades como o garimpo. “Identificamos padrões de julgamento que apontam para a incidência da contaminação e buscamos trazer essas evidências científicas para dentro do tribunal. A ideia é sensibilizar os magistrados e contribuir para a criação de protocolos que protejam a saúde do trabalhador, associando argumentos jurídicos com dados científicos. Nosso objetivo é aproximar as universidades e as clínicas de direitos humanos da rede amazônica do sistema de justiça, para que juntos possamos pensar estratégias que garantam justiça social, reforça.”
Incompatibilidade
Apesar da forte presença da mineração ilegal na Amazônia — atividade que frequentemente utiliza mercúrio em seus processos — os dados oficiais apontam maior incidência de casos em São Paulo. Cristina Terezo destaca que essa discrepância revela uma incompatibilidade entre os dados formais e a realidade vivida na região amazônica. “Realizamos audiências públicas e colhemos dados com a sociedade civil e cientistas locais que mostram uma realidade muito mais crítica do que os números oficiais indicam”, afirmou.
A professora Silvia Loureiro, da Universidade do Estado do Amazonas, reforça a necessidade de se ter um retrato mais realista da contaminação pelo mercúrio na Amazônia. “Em parceria com o laboratório de farmacologia molecular da UFPA, conseguimos evidenciar dados que antes eram invisibilizados na área da saúde. Apesar dos achados relevantes, o número de processos judiciais ainda é pequeno diante da gravidade e da extensão da contaminação por mercúrio na região amazônica.”
O desembargador do trabalho, Sérgio Rocha, ressaltou a relevância da pesquisa acadêmica sobre os impactos da contaminação por mercúrio, especialmente na região amazônica. “A contribuição da academia é absolutamente fundamental para o enfrentamento da contaminação por mercúrio, especialmente na nossa região amazônica. Sabemos que esse problema existe, mas ainda não conseguimos mensurar com precisão o seu alcance — tanto nas relações de trabalho quanto na saúde da população em geral. Os dados da pesquisa nos ajudam a entender como os diferentes ramos da Justiça estão lidando com essa questão. Isso nos permite planejar melhor nossas ações, visualizar com mais clareza o problema e tomar medidas concretas para proteger os jurisdicionados e prevenir novos casos”, reforça.
Políticas Públicas
O relatório também propõe a criação de políticas públicas mais eficazes e apresenta uma minuta de projeto de lei, que evoluiu para o Projeto de Lei nº 1011, voltado à regulamentação nacional sobre o uso e os impactos do mercúrio. A expectativa do grupo é que o TRT-8 atue como agente mobilizador, contribuindo para que os dados da pesquisa ganhem visibilidade e influenciem decisões políticas e judiciais.
Para a presidente do TRT-8, Sulamir Palmeira Monassa de Almeida, a pesquisa apresentada pelas universidades é essencial para que o tribunal compreenda melhor a realidade dos trabalhadores expostos ao mercúrio, especialmente na Amazônia. “Embora os números oficiais não revelem muitos casos, sabemos que isso se deve à baixa procura pela Justiça. A proposta que o PL 1011 traz de incluir a tipagem de metais pesados nos exames da rede pública é um avanço importante, pois mapeará com mais precisão os impactos na saúde do trabalhador. A Justiça do Trabalho está pronta para cooperar e fortalecer essa iniciativa”, destaca.
Texto: Danielly Silva - SECOM/TRT-8