Seminário sobre combate ao trabalho infantil reuniu especialistas no TRT8

O evento é uma realização do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI)
Foto dos participantes da mesa da abertura posicionados para o início da mesa. Mais a frente, o público sentado também aguarda.
#paratodosverem Foto dos participantes da mesa da abertura posicionados para o início da mesa. Mais a frente, o público sentado também aguarda.

“A gente não quer que o trabalho infantil seja invisibilizado, a gente quer que ele seja combatido”, declarou Clarice Ratis, de 14 anos, representante do Pará na Comissão Nacional de Participação de Adolescentes (CPA). Ela foi um dos convidados para a mesa de abertura do Seminário Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Infantil, realizado na quarta-feira, 25, no Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá), reunindo governo, especialistas e sociedade civil para discutir ações práticas no país.

"Hoje eu não falo somente por mim, mas por muitas crianças e adolescentes que não têm os seus direitos garantidos. O assunto trabalho infantil é, na minha opinião, pouco discutido, e muita das vezes deixado de lado, mas de extrema importância. Precisamos de mobilizações reais, que façam a diferença realmente e não só uma postagem em datas simbólicas. (...) O principal motivo [para o trabalho infantil] é a pobreza, que as autoridades não enxergam, ou enxergam e fecham os olhos. A sociedade civil precisa denunciar”, convocou a adolescente.

Katerina Volcov, secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), entidade realizadora do Seminário, aponta que há um bom tempo o Norte é visto como uma das regiões prioritárias para ação. “O Pará foi escolhido para sediar o evento por uma série de questões, mas principalmente por ser um dos campeões em violações de direitos [ele está em 1º lugar na região Norte quando se trata de trabalho infantil] e a gente gostaria de visibilizar o Estado para além da COP30”.

Foto da presidente do TRT8 Sulamir Monassa ao microfone durante o evento.

Os convidados foram recepcionados pela presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT8), desembargadora Sulamir Palmeira Monassa de Almeida, que conduziu a mesa de abertura. Ela destacou como é importante para o TRT-8 receber este encontro nacional. “É um tema muito presente no nosso tribunal, através do Judiciário Fraterno, dos comitês e comissões. São parcerias importantes para o combate a esse tipo de violência contra as crianças e adolescentes. É também uma forma do Poder Judiciário promover justiça social”, aponta.

A juíza do Trabalho Vanilza Malcher, da 2ª VT Belém, uma das gestoras da Comissão Regional de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do TRT8, afirma que é “de extrema importância” o tribunal receber este seminário nacional. “O Fórum é uma instituição que o TST integra, assim como o TRT8. E este é um momento para a gente reunir representantes não só da sociedade civil, mas de órgãos do poder público que compõem toda a rede de proteção da infância. Nós vamos falar sobre perspectivas e os desafios, que são gigantescos, e nós precisamos estar fortalecidos para enfrentá-los”. 

À frente de projetos como o Judiciário Fraterno, que oferece formação para as famílias, além de atividades lúdicas para as crianças, sempre com conscientização sobre a importância da educação e os malefícios do trabalho infantil, a juíza Vanilza Malcher destaca como o TRT8 tem monstrado sua potência nesta rede de combate ao trabalho infantil e de estímulo à aprendizagem. “Quando se trata de infância, o sentimento tem que ser sempre de urgência, porque a infância é breve e ela não pode esperar”.

Diretor da OIT durante a mesa de abertura, ao microfone.

O economista Vinícius Pinheiro, diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para o Brasil, destacou que a realização do seminário é especialmente uma questão de sensibilização. “Em segundo lugar, [o seminário ocorre] para discutir, intercambiar experiências, conhecer as melhores abordagens para esse assunto, que envolve tanto políticas de educação, políticas de potência social, de inspeção e fiscalização. A dosagem dessas políticas é fundamental para combater o trabalho infantil em escala nacional”. 

Sobre a atuação da OIT, dentro dessa rede de proteção à infância, ele a define como uma instituição, em primeiro lugar, normativa. “O Brasil é signatário das convenções da OIT, em especial da idade mínima [para o trabalho]. E também é uma instituição que apoia o governo e os parceiros sociais com medidas concretas, tanto no nível de programa e de atuação política, mas também em projetos. Aqui no Pará, por exemplo, nós estamos iniciando agora um projeto de combate ao trabalho infantil e promoção de trabalho decente na cadeia produtiva do açaí. Nós vamos estender também para o Cacau. Então a gente tem esses três níveis: leis/normas, programas e projetos”.

O procurador antônio oliveira e a juíza vanilza malcher junto a dois adolescentes do projeto judiciário fraterno.

Antônio de Oliveira Lima, procurador do trabalho e coordenador da Rede Peteca, no Ceará, reforça como é necessário aprofundar os debates e fortalecer a articulação intersetorial. “Eu identifico hoje, como grandes desafios dessa luta ainda, a identificação das crianças e adolescentes e o atendimento delas, porque a estatística do IBGE aponta 1,6 milhão de crianças e adolescentes na situação de trabalho, porém o número de crianças e adolescentes que são acompanhados nos serviços sócio-assistenciais dos municípios, dos estados, é bem ínfimo comparado com esse número. Sem conhecer não dá para proteger”.

Ele comenta que, atualmente, o Ministério Público do Trabalho (MPT) conta com três ações estratégicas, uma no campo da educação, que é o projeto “MPT na Escola”, em todo o Brasil, que nasceu a partir da Rede Peteca, criada no Ceará; o outro é um projeto que atua nos municípios com maiores incidências de trabalho infantil, fortalecendo as políticas públicas de combate de trabalho infantil; e o outro está no campo da aprendizagem profissional, para acolhimento e inserção de adolescentes vítimas de trabalho infantil e outras vulnerabilidades. 

Sobre as dificuldades para a atuação do MPT, ele afirma que são muitas. “A maior delas é a fragilidade das políticas públicas e dos sistemas de fiscalização. Em muitos municípios, principalmente nos interiores, não temos auditores fiscais para fiscalizar”. Há também os casos em que o MPT não identifica o empregador. “O trabalho infantil doméstico, o trabalho infantil na agricultura familiar, de atividades informais, e isso é um desafio maior, porque não é só uma ação de fiscalização, é muito mais uma ação de proteção e atendimento das famílias. Muitas dessas crianças e adolescentes trabalham ajudando no sustento dessas famílias, que estão extremamente fragilizadas nos seus direitos básicos”.

Roberto Pageli Guimarães, auditor fiscal do trabalho e coordenador da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI), acrescenta que o trabalho infantil é um fenômeno complexo, que se apresenta de diversas formas, tem diversas causas, sem discordar que a pobreza é uma das causas, mas não a única. “Assim, para o combate ao trabalho infantil, nós temos que realizar uma gama de ações. Não existe uma fórmula, mas várias fórmulas que têm que ser adotadas. Em um evento como esse, a gente pode trazer, por exemplo, a questão do trabalho infantil na internet. É uma nova forma de trabalho infantil, que tem que haver um diálogo, uma reflexão sobre ela”, aponta.

Clarice Ratis durante discurso na mesa de abertura do seminário.

Luísa Carvalho Rodrigues, procuradora do trabalho e coordenadora nacional da Coordenadoria de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Coordinfância) do MPT, reitera as declarações dadas pelos colegas. “Infelizmente, na nossa sociedade, ainda é muito comum que pessoas inclusive defendam o trabalho infantil, que entendam que ele é melhor do que outras alternativas, quando na verdade a gente deveria estar buscando pleno acesso a todos os direitos para as crianças e adolescentes do país, não só para algumas”. 

Essa resistência à erradição do trabalho infantil se deve também a alguns mitos, aponta a procuradora. “Infelizmente, existem esses mitos de que ‘é melhor trabalhar do que roubar’, como se fossem duas únicas alternativas, ‘que trabalhar não acaba com a vida de ninguém, não mata ninguém’, que também é uma outra mentira. A gente sabe que tem muitas crianças e adolescentes vítimas fatais de acidentes de trabalho, e que, se não morrem, têm a sua integridade física e psíquica afetada, com acidentes mutiladores e outros problemas. Nós precisamos desconstruir na nossa sociedade esses mitos. Então esse é um outro obstáculo muito grande”.  

A juíza do Trabalho Roberta Santos, diretora de Cidadania e Direitos Humanos da Associação Nacional das Magistradas e dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) e presidente AMATRA 8ª Região, também falou da importância da conscientização da população e dos magistrados. E assim destaca as associações da magistratura como aliadas fundamentais na luta pela erradicação do trabalho infantil. “Nós temos aqui a nossa Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, que é uma referência nacional, e realizamos diversas ações em parceria, como é o caso da Campanha do Círio de Combate ao Trabalho Infantil. Então, queremos dizer que nós vamos estar sempre juntos nessa pauta”. 

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Texto: Lais Azevedo / Secom TRT8
Fotos: Camila Souza/ Secom TRT8